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Os riscos da bolha salarial e o Brasil

Estudo de caso do segmento de agências digitais
Por Marcelo Samogin, diretor da REMUNERAR

O pragmatismo histórico nos ensina entre outras coisas que a economia vive de ciclos, e que um ciclo de expansão se alterna com outro de recessão. Na prática a questão central é estimar a intensidade e o tempo de cada ciclo, trabalho para economistas e estudiosos. Mas que relação este conceito teria com o crescimento da massa salarial e dos níveis de salário em muitos segmentos no Brasil?

O aumento do gasto público dos governos em infraestrutura e programas sociais, as recentes crises fruto do excessivo endividamento das economias norte americana e zona do euro, além do grau de investimento conquistado pelo Brasil atraiu e atrairá capitais estrangeiros que fomentarão investimentos no país, que por sua vez demandarão recursos de todos os tipos: naturais, estruturais, tecnológicos, e mão de obra qualificada. Sempre que há um desequilíbrio entre oferta e demanda de um produto, mercadoria, serviço ou recurso, há um desequilíbrio nos preços. Os fornecedores estarão mais encorajados para vender mais caro seus produtos e serviços e também os clientes compradores estarão mais dispostos a pagar preços mais altos. Este raciocínio somente fica distorcido quando temos um ambiente competitivo de poucos fornecedores ou poucos compradores, conhecidos como mercados de concorrência imperfeita, oligopólio ou oligopsônio, respectivamente, sendo que nenhum deles se aplica ao mercado de trabalho.

O Brasil, a exemplo de outros pela falta de planejamento e visão, atravessou de forma míope duas décadas de ambiente inflacionário e deixou de investir como deveria em educação e formação profissional ao longo do tempo, o que corrobora atualmente para inflacionar os salários de profissionais em determinados segmentos, especialmente aqueles que recebem mais investimentos com forte demanda por novos negócios e taxas de crescimento de dois dígitos ao ano. O fato é que de maneira geral todos os segmentos são afetados.

A pressão por entregas, oportunidades de explorar novos segmentos e novos contratos encorajam empreendedores e empresas a contratar profissionais especializados por valores acima das médias históricas para os padrões de mercado, evidenciando o desequilíbrio sustentado por negócios em ritmo crescente de volume. Como a economia alterna ciclos de expansão e retração, este custo marginal de mão de obra é uma ameaça para o equilíbrio econômico financeiro das empresas num momento de esfriamento da atividade econômica, a exemplo do choque de 2008 causado pela crise no mercado imobiliário e financeiro norte americano, tendo como resultado um grau sem precedente de endividamento de diversos países, crises sociais e recessão econômica.

O governo central do Brasil, ao mesmo tempo em que sustenta uma das mais altas taxas de juros do mundo para se financiar e frear a inflação de demanda, se vê obrigado a manter os investimentos em infraestrutura em todas as áreas, desde aeroportos a saneamento básico, passando pelos grandes eventos esportivos e a exploração de petróleo na camada pré-sal, eventos que alimentam a espiral de demanda por mais produtos, serviços e recursos como mão de obra qualificada em segmentos diversos, sem mencionar o efeito que as abundantes linhas de crédito do mercado exercem sobre o consumo das famílias ávidas por moradias próprias e por bens de consumo duráveis que no passado recente sequer tinham acesso.

O desafio de gerenciar pessoas e suas carreiras de forma responsável numa empresa é exponencialmente maior em ambiente de economia aquecida. Os planos de treinamento, antes engavetados, desprestigiados e tidos como não essenciais para muitos acionistas e gestores, hoje são vistos como mandatórios e como fator chave de sucesso no bojo das estratégias de crescimento das organizações.

De forma também pragmática não é questão de modismo ou bondade interna investir em treinamento e qualificação, é uma questão de necessidade. É bem verdade que nas pesquisas em geral o salário não figura entre os elementos mais motivadores entre profissionais, ao contrário das ações de treinamento, qualificação, preparo e cursos que rendem altos índices de aceitabilidade nas pesquisas de clima interno.

Pesquisa recente realizada no último trimestre de 2011, fruto da parceira entre a ABRADi (Associação Brasileira de Agências Digitais) e a consultoria REMUNERAR, especializada em projetos de remuneração estratégica, envolveu 112 empresas do segmento de diversos portes e regiões do Brasil e mostrou a realidade de um setor aquecido.

De acordo com a pesquisa, o mercado de agências digitais contratou duas vezes mais do que a média nacional do setor de serviços. No período de julho a setembro de 2011, as empresas contrataram mais do que demitiram, gerando um diferencial positivo acumulado de +3% de vagas efetivas, versus um crescimento de 1,55% das contratações no setor de serviços no país, segundo dados do mesmo período do CAGED do Ministério de Trabalho e Emprego.  Outra evidência de aquecimento reforçado pela pesquisa fora a evolução média dos salários dos cargos técnicos que apresentaram uma variação positiva real de 35,3% em relação ao ano de 2010.

Encorajados ou não pelo apagão de mão de obra, os investimentos em qualificação, desenvolvimento e aprimoramento de profissionais reconhecidamente se mostram como poderosa ferramenta de gestão de recursos humanos para atrair e reter pessoas diferenciadas. A mesma pesquisa da ABRADi mostrou que as empresas que concedem como prática cursos de aperfeiçoamento tem em média 25% mais funcionários com 3 ou mais anos de casa, em comparação ao grupo de empresas que não oferecem tais cursos. Este dado reforça a estratégia bem sucedida das empresas neste segmento de que oferecer ou subsidiar cursos e treinamentos é uma eficiente ferramenta de retenção com forte aderência entre os profissionais em fase de formação de carreira, a exemplo do que acontece no setor de agências digitais onde 85% dos profissionais das empresas pesquisadas têm até 28 anos de idade.
Além de investirem em treinamento, o número de agências que criaram seu programa de participação nos resultados em 2011 cresceu quase cinco vezes em comparação com os dados da pesquisa de 2010. Este comportamento sugere que além do esforço de reter profissionais através da concessão de cursos há uma preocupação de oferecer uma remuneração variável por resultados atrelado ao desempenho do negócio.

Sabemos que para cada setor existem estratégias específicas de gestão dos custos em decorrência da evolução dos salários praticados no mercado. Embora estratégias de conversão de custos fixos em variáveis e sincronização destes ao volume de negócio através de políticas de gestão de pessoas não solucionem todos os problemas causados por uma crise ou recessão, certamente servirão como ferramenta para atenuar os efeitos desta, inclusive no caso de uma bolha salarial.

Além do plano de participação nos resultados outros programas de premiação por produtividade podem ser criados para gerar recompensas conforme o aumento de produtividade, ainda que sobre esses valores a empresa tenha que pagar os impostos como a lei determina. Ao contrário do plano de participação nos resultados que isenta a empresa dos impostos sobre tais valores. Também é razoável pensar que os custos adicionais de remuneração variável sejam pagos pela produtividade marginal gerada pelo próprio programa, através da redução dos custos de produção e perdas, melhor clima interno, maior agilidade e qualidade, que vão impactar positivamente a percepção de valor dos clientes e a rentabilidade das operações.

Notadamente, toda e qualquer estratégia que transforme parte do pacote de remuneração dos funcionários em parcela de remuneração variável atrelada a resultados operacionais e do negócio contribuem para blindar a saúde econômica financeira da empresa num momento de crise, uma vez que tais estratégias sincronizam em proporção significativa as variações positivas e negativas do crescimento do volume de negócios e os custos decorrentes de operação, incluindo-se os custos de mão de obra.

Num momento de crise as decisões predominantes focam a sobrevivência do negócio, desdobrando-se em ações com resultantes de perda de investimento em ativos imobilizados, perda de investimentos em pessoas chaves, perda de confiança interna, altos desembolsos de curto prazo para pagamento das rescisões de contrato, entre outras perdas intangíveis para a empresa. Lembrando que um ciclo de expansão econômica será sucedido sempre por um ciclo de recessão, e vice-versa, o desafio é definir estratégias para crescer acelerado e tomar decisões hoje que minimamente atenuem o impacto negativo nos momentos de crise.

Como implementar a PLR sem que o lucro, faturamento e rentabilidade façam parte das negociações? Acesse o artigo “Implementando o PPR ao invés do PLR” e descubra como viabilizar um plano deste tipo.

Marcelo Samogin, Diretor de Negócios da REMUNERAR, consultoria especializada em remuneração estratégica. Economista pela PUC-SP, com MBA pela FIA-USP e especialização pela FGV-SP. Atuou por mais de 23 anos como executivo de RH, especialista em remuneração e inteligência de negócios nos segmentos de indústrias, prestação de serviços e varejo de luxo. Contatos: contato@remunerar.com.br ou www.remunerar.com.br.

Sobre a REMUNERAR

A REMUNERAR foi fundada em 2010 e tem por missão desenvolver soluções inteligentes de remuneração e recompensa que transformem os desafios de produtividade e crescimento de seus clientes em oportunidades reais de ganhos e resultados diferenciados através das pessoas.

(http://www.linkedin.com/in/marcelosamogin)

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